sábado, 4 de maio de 2013

Sorriso

quem não viu o riso que a menina trazia no rosto
não viu que havia um...

não viu que havia...


não viu que...

não viu...

não...










não viu que um sorriso se basta.







domingo, 28 de abril de 2013

Proposta de utilização do filme "Uma vida iluminada" em sala de aula




Introdução
                A proposta a seguir trata da utilização do filme Uma Vida Iluminada (2005;  Liev Schreiber) como aula inaugural em turmas de história, podendo ser utilizado com alunos do oitavo ano do ensino fundamental, em diante.
Existe um grande desafio para o professor de história e abordar questões com seus alunos, que fazem parte do cotidiano do historiador: qual o sentido da história, e qual a razão de alunos tão novos terem que se identificar com um passado que lhes parece tão distante. Existe uma razão, senão um acúmulo de fatos passados, que justifique o tempo de seus dias dedicados à tal disciplina?
                Não se pode ignorar que existe certa legitimidade na recusa dos alunos em se motivar, ou o certo vazio que eles sentem ao se sentirem tão distantes das razões pelas quais eles são confrontados com o passado histórico, posto que a própria definição do trabalho do historiador não é algo tão nítido para boa parte daqueles que não vivem o cotidiano das ciências humanas.
                Preocupado com a concorrência que os filmes e demais formas de resgate do passado oferecem ao historiador, Roger Chartier afirma que o conhecimento produzido pelo historiador não é mais do que uma das formas de se relacionar com o passado. Assume, também, que memórias ou filmes podem ser mais poderosos, nesse sentido, do que os próprios livros didáticos. Buscando diferenciar o âmbito da memória e da história, apresenta como uma possibilidade, o fato de
 
“à imediata fidelidade (ou suposta fidelidade) da memória, opõe-se a intenção de verdade da história, baseada no processamento dos documentos, que são vestígios do passado, e nos modelos de inteligibilidade que constroem sua interpretação” (CHARTIER; 2007)
 
                Nesse sentido, a utilização de um filme pode, a princípio, levar o aluno a questionar o ambiente da memória e da história, enquanto condições distintas do resgate do passado, mas indissociáveis em seu processo. O filme aqui não seria uma tentativa de recontar o passado, mas de compreensão das formas como o passado pode ser apreendido por quem se debruça sobre ele e, de que maneira, cada interpretação pode se transformar em um objeto de interesse da história.
                Em outro momento, estabelece a diferença ente memória e história, situando a primeira em um plano pertinente às exigências existenciais das comunidades. A segunda, se estabelece como um saber aceitável e científico (CHARTIER; 2007).
                Simplesmente, tratando de filmes, sob uma perspectiva mais ampla não podemos considerá-los, como também afirma Chartier, uma informação sobre o real, sem poder requerer a posição de descrição dessa mesma realidade. Ao tratar, especificamente do filme escolhido para este trabalho, temos duas dimensões distintas a ser exploradas: a primeira, a do filme como um relato de um acontecimento histórico, no caso, uma ocupação nazista; na segunda possibilidade, já estamos dentro do roteiro do filme e podemos abordar a memória, enquanto resgate de um passado e o próprio processo de funcionamento dessas “exigências existenciais”. É importante ressaltar que para alunos mais novos, o conceito de memória e de história são flexíveis ao ponto de se misturarem e se confundirem até chegar a significar a mesma coisa, então, o alcance de um processo dito científico no trato da história não deve ser sobreposto ao entendimento “do que é memória”. Estudar e entender os processos de definição e atuação do campo da memória, seja quando é agente significador de culturas, seja quando é projetada em meio a uma cultura formadora de senso comum e, portanto, capaz de agir sobre sua própria transmissão; é tão pertinente quanto a própria análise documental da história.
                A primeira dimensão não se fará tão relevante, pois não é do que se trata a escolha do filme, como estratégia de ensino, mas à segunda, será dada uma atenção especial na própria análise do filme, que será vista à diante.
                A mistura entre as possibilidades do filme e da memória se fazem presente ainda, no questionamento acerca das possibilidades que Robert A. Rosenstone apresenta ao filme histórico, pois a representação de um fato histórico em um filme é tão problemática quanto a própria representação da história, pois sempre o passado pode ser substituído por uma versão, ou por alguma projeção de como ele poderia ter sido (ROSENSTONE; ). Então, novamente, nosso objeto aqui trabalhado pode cair nesse dilema, em suas passagens que falam da guerra; bem como, à memória dada aos personagens também incidirá os mesmos questionamentos.
                É importante o aluno se sinta à vontade para apreender do filme, conclusões que lhes sejam pertinentes e que suas idades e estágios de desenvolvimento escolar sejam respeitados na hora de um possível debate ou da inserção das possibilidades do filme na comunicação com outras partes e momentos do desenvolvimento do aprendizado da história. A ideia inicial é que Uma Vida Iluminada possa ser revisitado em vários momentos do ensino dos temas referentes à idade escolar do aluno, mas os pontos aqui tidos como possíveis de serem trabalhados não devem ganhar status de “matéria” escolar, sim, serem vistos como potenciais pontos de partida para que os alunos possam, à sua maneira, relacionar filme e livro didático.
                De acordo com Roger Odin, o público nem sempre vai reagir com o filme, na perspectiva pretendida. Se tal observação cabe ao próprio roteiro, ela é pertinente ao professor, que faz uma apropriação didática da linguagem fílmica e corre o risco de não ser correspondido em sua ideia inicial.
                Públicos diferentes reagirão de formas diferentes ao texto que lhes é apresentado. O que se, por um lado pode parecer uma dificuldade posta aos objetivos da aula, por outro se faz uma possibilidade de traçar caminhos que demonstrem aspectos sobre a relação do aluno com o tema proposto.
O Filme:
Uma Vida Iluminada é um filme que oscila entre o drama, a representação histórica e a comédia. Seus personagens são muito bem delineados, em cenas que os constroem e oferecem ao espectador muito mais do que meras descrições acerca de seu caráter e de seus dramas. As falas, a bela fotografia e a trilha sonora em perfeita harmonia com a série de acontecimentos que marcam a narrativa são mais elementos no filme, pois se fazem potenciais significantes para a compreensão e apreensão de todas as possibilidades que vão construir os personagens e oferecer elementos que possibilitam acompanhar suas evoluções ao longo da trama.
                As primeiras sequências do filme mostram um painel com memórias de família e um narrador marcado pelo uso da primeira pessoa, mesmo sem ainda ter sido “apresentado” à trama. Aparentemente, o narrador se apresenta distanciado da história que se apresenta no painel, pois fala de Judeus (que a associação entre a narração e a sequência de imagens faz parecer ser a família ali representada) de forma irônica. Vale a atenção do professor para essa primeira sequência, pois pode ser o início de uma discussão acerca do preconceito que costuma-se ter com culturas por nós desconhecidas ou ignoradas, assim, tem-se o primeiro ponto para o debate sobre a dimensão da própria História, enquanto disciplina escolar.
                Na sequência seguinte, o narrador já tem um rosto e segue escrevendo o que parece ser um livro ou um diário (no decorrer do filme, percebe-se que seus escritos compõem um livro ou algo no mesmo formato). O ponto mais importante da sequência, para o que se espera apresentar neste trabalho é sua fala a respeito de não entender o fato de os judeus se preocuparem com o passado, fato que para ele, não fazia, até então, sentido. Em sua perspectiva, o passado não é relevante.
                Ironicamente, o narrador – Alex – é a terceira geração de uma família que tem por atividade comercial, uma agência de turismo especializada em guiar judeus em na busca de suas origens, sobretudo, quando se tratam de famílias que buscaram refúgio em outros países, por conta da segunda grande guerra. Os questionamentos de Alex, acerca da busca pelo passado são mais do que facilitadores do debate acerca da própria importância da investigação histórica como possibilidade de autocompreensão e da perspectiva da nossa disciplina como uma ciência que muito se vale do passado para explicar o presente.
                Jonathan é o colecionador, um judeu que centralizará as ações do filme. No plano temporal, é a partir de sua chegada à Ucrânia e do encontro com Alex e seu avô, o cômico guia cego que além de ser o motorista da expedição, é marcado por seu mau humor e aparente antissemitismo. No plano da construção psicológica dos personagens, são suas descobertas que significarão os novos (ou nem tão novos) conhecimentos que determinarão mudanças significativas na autocompreensão dos outros dois personagens.
                O lado cômico de Jonathan fica por conta de ser um colecionador compulsivo e indiscriminado. O painel apresentado no início do filme é, nitidamente, o resultado alguns anos de cultivo do hábito e o apego especial por objetos relacionados a sua família.
                O encontro entre o Judeu americano e os inusitados guias acontece depois de uma cômica recepção improvisada, quando Alex tenta fazer com que uma pequena banda de artistas de rua, que se apresentava na estação de trem, receba seu cliente ao som do hino dos EUA. A partir daí, elementos cômicos e dramáticos darão a tônica de um choque cultural manifestado pela dificuldade de Alex com a língua inglesa, pelo estranhamento em relação a algumas particularidades de Jonathan e pela insistência do americano em se valer de seu guia turístico para se relacionar com pessoas que apareciam em seu caminho.
                Em sala de aula, os elementos cômicos e dramáticos podem ser usados como uma espécie de termômetro, pois a reação dos alunos pode apontar uma série de possibilidades no campo de suas afetividades, assim, possibilitando que a análise fílmica e o objeto da aula não se tornem “maçantes” ou os deixem dispersos.
                Boa parte do filme se dá em uma estrada e em algumas eventuais paradas para informações ou hospedagem. Existe um fato interessante acerca da própria estrada, que não pode ser negligenciado. Em um dado momento da viagem, os três saem de uma via movimentada e entram em uma auto estrada, onde, na maior parte do tempo, o carro da empresa de turismo anda sem a companhia de outros veículos. No final do filme, ao saírem da autoestrada e entrarem novamente em perímetro urbano, os três personagens entram em uma via bastante movimentada e o plano escolhido para a filmagem mostra o carro, de cima, se misturando aos demais e “voltando à rotina” da cidade. É interessante que a entrada e a saída podem servir de alegorias para a própria jornada de pesquisa ou de conhecimento, pois o resgate do passado pode ser visto como a entrada nessa estrada e a mudança de cenários detectada na saída, sobretudo por personagens tão modificados por suas jornadas ao seu passado, representa um retorno ao cotidiano, ao mundo das relações do indivíduo, mas dessa vez, acrescido de uma gama de memórias e conhecimentos que serão ali reexperimentados nessas mesmas relações habituais.
                A estrada, marcada por uma bela fotografia e pela quase ausência de outras relações, senão as que ocorrem dentro do carro, é quase a perfeita alegoria do mergulho no passado e no autoconhecimento.
                O objetivo da jornada é uma vila chamada Trachimbrod e a dificuldade está no fato de as poucas pessoas as quais as informações são pedidas desconhecerem tal vila. Existe na busca, uma relação que se coloca cada vez mais intensa entre os personagens. A tensão nos momentos mais complicados da viagem mostra uma relação de cumplicidade, mas ao mesmo tempo, conflituosa.
                A busca que justifica a empreitada dos três personagens tem seu início com uma fotografia, um adereço e um depoimento feito em leito de morte. A partir daí, juntando os personagens, como são descritos e a própria estrada, podem ser comparados, em uma perspectiva própria para a sala de aula, com o trabalho que o historiador tem quando se depara com um dado objeto ou documento que se faz fonte histórica. Nesse exercício, pode-se trabalhar a ideia de uma fonte histórica que não “fala” por si só.
                Existe ao longo da trama uma série de falas e diálogos que podem ser problematizados pelo professor. Um deles se dá no momento em que ao se dirigirem a um garoto em busca de informação, o pequeno  inicia o seguinte diálogo:
- O que é Trachimbrod?
- Só um lugar que procuramos.
-Se não tem nada lá, por que estão procurando?
                O menino encontrado à beira da estrada não percebe a importância de uma busca, pois a princípio, se não existe uma objetividade aparente, nada acaba justificando uma busca.
                Outro diálogo digno de nota ocorre entre Alex e Jonathan, quando o primeiro questiona o hábito do segundo de coletar objetos e revesti-los em um pequeno saco plástico (semelhantes ao usado na sequência onde a coleção é apresentada ao público). A resposta de Jonathan tem um ar de uma conclusão recente e pouco solidificada: “talvez por medo de esquecer”.
                A primeira sequência aqui destacada pode ser trabalhada em seu sentido mais óbvio, que é como ponto de partida para o mesmo conhecimento, mas dessa vez, tangenciando o próprio aprendizado da história, como algo que não pode ser submetido a uma lógica de simples funcionalidade superficial, pois todas as descobertas feitas ao longo do filme, também não estiveram sujeitas a essa mesma funcionalidade. O segundo fragmento é mais representativo, pois o Personagem Jonathan ao final da trama, se desfaz de dois objetos pessoais e de punhados de terra que coleta quando a viagem chega ao fim. O momento em que Jonathan distribui os objetos é tão marcante emocionalmente, que vale a pena incentivar um debate sobre o que poderia ter feito um colecionador inveterado a abrir mão de tantos objetos significativos para si. Possivelmente, aqui, pode-se ter um bom termômetro sobre a atividade com o filme.
                A jornada em busca de Trachimbrod segue e o personagem do avô de Alex começa a viver uma virada na trama, o lado cômico de velho rabugento vai dando lugar ao personagem mais dramático, marcado por tomadas de câmera que o isolam mais em meio a paisagem e uma trilha sonora mais compatível com a reflexão do que com o comportamento explosivo. Como se fosse passar uma mensagem ao espectador, seus movimentos são mais surpreendentes, seus gestos mais lentos e a forma como ele se relaciona com o ambiente dão pistas de uma quase misteriosa familiaridade, que virá a ser revelada.
                Quando se depara com algumas ruínas, o ancião tem seu rosto em primeiro plano na imagem e o seu olhar é a melhor forma de perceber que existe, ali, uma relação com o ambiente. O contraplano, marcado pelo “achado” é contemplado como se significasse algo muito marcante.
                As cores vivas da fotografia vão cedendo lugar para as tomadas em preto e branco enquanto um flashback mostra um enfileiramento de botas militares, pés descalços e calçados mais simples, contrapostos. Quando a imagem se revela, temos o amadurecimento de um dos personagens e a mudança que os outros dois personagens principais e o espectador têm do Avô supostamente cego e supostamente antissemita, que passa a ser mais cortês e mais disposto à interação com seus companheiros de viagem aos poucos, também revela-se ao deixar pistas de não ser a primeira vez a estar no lugar onde estavam.
Jonathan partiu para a Ucrânia buscando um lugar onde encontraria a pessoa que ajudou seu avô a fugir, buscava saber mais sobre seu passado e concluir a busca iniciada com a foto e as pistas que tinha, já, nos EUA. O fim da sua busca se dá em um ambiente de extrema felicidade, em se tratando de fotografia. O carro se perdendo em meio a uma plantação de girassóis (que trazem sua simbologia para misturar roteiro e fotografia) e uma casa centralizada com roupas brancas em um varal.
                Ao buscar a tomada que parte de um plano horizontal até se tornar aérea, a casa e o varal são emoldurados pela plantação que se perde em um foco quase infinito e quase homogêneo.
                Simultaneamente ao belo diálogo com a moradora da casa, Alex, enquanto narrador, nomeia seu último parágrafo: Capítulo 5 – iLUMINAÇÃO.
                Ao perguntar para a senhora que lava uma peça de roupa branca, onde fica Trachimbrod, Alex recebe uma bela e misteriosa resposta: “Eu sou Trachimbrod”. À resposta, segue-se uma série de descobertas sobre fatos terríveis e desencadeamentos de memórias que não podem ser descritas, senão, pelo nome dado ao capítulo: iluminação.
                A sequência virá a descortinar o mistério iniciado com a mudança de comportamento do avô e o final da busca.
                Trachimbrod não existe, senão na memória de uma sobrevivente do massacre que dizimou o local e seus habitantes; além de uma placa fincada ao solo à beira de um rio, por isso, muitos pontos podem ser levantados acerca da memória, da importância da preservação e do constante resgate do passado.
                Novamente com a fotografia em um outro tom, revela-se a memória do avô, a forma como sobreviveu ao mesmo massacre e o gesto simbólico de retirar a jaqueta com a estrela de David, gesto que explica o fato de sua família não conhecer sua ascendência judia.
Em Uma Vida Iluminada, não só o passado é explicitado, mas nosso personagem se relaciona com ele, ressignificando-o e por consequência sendo por ele ressignificado. É o passado histórico que se faz presente, não só a sequência de fatos ocorridos ganham importância na narrativa. Por isso, o esforço em se compreender a história e a apropriação do passado vão se materializar no campo das representações, não na simples tomada de consciência sobre fatos idos.
Obviamente, não seria interessante interromper o filme a cada observação, mas alguns pontos devem ser explorados pelo professor, além dos já comentados:
·         A simbologia da coleção de objetos;
·         A influência dos EUA na vida de Alex;
·         A importância da história para os judeus;
·         O porquê da história contada por capítulos;
·         O significado do gesto simbólico da jaqueta;
·         “Descoberta”  do neto pelo avô e do avô pelo neto, resultando em manifestações de afetividade;
·         O significado da foto como ponto de partida da busca;
·         Possibilidades de interpretação para o final do filme, quando atores que passaram pela trama, retornam já em solo americano e no caminho de Jonathan (pessoas comuns tendo rosto);
·         Diferença entre a coleção de Jonathan e a que caracteriza Trachimbrod;
·         A importância da Senhora para Trachimbrod;
·         Simbologia do girassol;
·         Superexposição à luz e a aproximação em close no momento onde o Avô se recorda de seu passado e quando Jonathan sai do aeroporto.
 
 
Ficha técnica:
Título original: Everything Is Illuminated;
Ano: 2005;
Língua: Inglês
Diretor: Liev Schreiber
 
 
 

sexta-feira, 8 de março de 2013

Na prática, a teoria é outra.



Na prática a teoria é outra ou na prática quem teoriza é outro?
Qualquer pessoa que se prepara para exercer a docência já se preocupou em elaborar planos de aula pautados em teorias absorvidas na aula de didática. Normalmente, tais planos são expostos para uma plateia de estudantes de graduação acostumados com os objetivos gerais e objetivos específicos da vida. Normalmente, trazem vídeos, jogos, e várias outras dinâmicas dispostas a trabalhar possibilidades cognitivas e afetivas dos temas. Toda proposta parte da superação do atraso das aulas expositivas convencionais e do fracasso do livro didático como instrumento de ensino. Pensa-se muito em transformar a história tirando-a do factual e levando para a vida do aluno, como se a construção do factual e sua seleção enquanto elemento “relevante” para o conhecimento, não se comunicasse com a própria construção do imaginário que a criança e o adolescente trazem de suas famílias.
Mas, e aí, como fica tudo isso quando a sala de aula não é composta por colegas solidários e um professor que quer devolvidas as técnicas que ele defendeu ao longo do semestre? E quando forem as crianças de 12 ou 13 anos? Universos particulares, únicos e que não aceitam ser homogeneizados? E se a sala não for mais seu território, mas o território deles? A teoria é outra?
Por mais paradoxal que pareça, existem estudantes que vão ficando experientes em educação e passam a se dedicar à fiscalização da prática de seus colegas mais velhos. Não que o conhecimento recém-absorvido na universidade não possa servir de parâmetro para novas orientações sobre o ensino, nem que o tempo de serviço dos professores em atividade seja sinônimo de bons ensinamentos para os mais novos, mas o que se ouve dos colegas que voltam do estágio, beira a covardia, pois é muito fácil aplicar uma bela atividade em uma turma que não é a “sua turma”, onde você não esteja até o pescoço atolado com as contradições da educação. É muito fácil poder usar o tempo que quiser, se não é você quem será cobrado pelo programa.
Aí acontece que você vai para lá. E aquele livro didático que você tanto quer superar deve ser usado, pois o pai pagou por ele e ele é o que vai dar segurança para o aluno. Você vai escutar o aluno perguntando que horas vai começar a aula, depois de você ter passado 40 minutos explicando como a história pode fazer parte de sua vida, mesmo, fora da escola. O imaginário sobre o que é uma aula não se desfaz do dia para a noite. Aí aquela teoria que foi para o plano de aula, como fica? Ela não cabe na escola da vida real? A escola onde você tem uma hora e vinte só com uma caneta pilot ou um giz? Cabe e sempre coube, mas cabe se aquela teoria dos bons tempos da faculdade não for pensada só de forma pragmática e funcional; cabe se os clichês que os acadêmicos adoram verbalizar forem acompanhados de uma pergunta muito simples: como?
Revoluções são feitas na prática, ali onde seu tempo para pensar é pouco e a teoria não é tão redonda quanto parece. Não adianta você ter a teoria na cabeça, se ela não educar o instinto, se ela não for dialogar com o aluno. E é nessa relação que o professor é transformador: quando consegue transformar sem esperar que as condições ideais apareçam como em um passe de mágica.
É ali, na contradição diária que a sua teoria deve ser aplicada e é ali que se pode ver quem pensou na teoria como um instrumento, não como um joguinho retórico encerrado em si.
Pode ser que na prática a teoria seja outra, ou pode ser que a teoria sempre esteve a exigir outras práticas e o professor só vai perceber quando ele estiver ali, onde a teoria não se basta e o conforto do “mais do mesmo” é mais que tentador.