sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Amor possível

Amar a humanidade
Estranha opção
Não quero amar a humanidade
Não tenho amor gratuito a distribuir

Amar a humanidade
Não sei
Não quero

Amar a humanidade?
Sem a genialidade?
Sem a poesia?
Sem o gesto nobre?
Sem a força?
Sem beleza e sem magia?

Amar a humanidade
Sem ver nela a luta por melhores dias?
Sem ser velho com lembranças?
Sem ser jovem com esperanças?

Não
Amar a humanidade é como amar o ar
E não a brisa
Amar a água sem a sede

Amar a humanidade
É não querer amar de verdade

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Sombra da dor que clareia

Sentido de ideias que se perdem

Olhos marejados

Ideias difusas como a luz na água

Os olhos nada vêm

Mas a sombra da dor clareia

Não entendo vendo

Não vejo às sombras formadas

O sofrimento apaga a visão

Sou externo a mim

Não vejo mais a luz que incendeia

Sou sentido na sombra que clareia.

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

muda alma muda

O silêncio tímido muda a alma
A alma muda,
 mudada se nua
por isso, se veste
e disfarçando muda a nudez que o silêncio esconde
mas,
quando descoberta em desejo
prenha de vontade
grita, geme e fala alto
posto que
Na verdadeira nudez
 toda mudez desaparece

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Despedida onde não se pensa



Não creia na razão que dispensas ao falar
Dispense as memórias que não fazem rir
O amor não reconhece argumentos
Não cabe em “saber o que fomos”

Quando não somos algo a ser
Ver além, e pensar no futuro
É perder o sentido latente do rompante

Se viramos planos feitos de passados
Virarei a página e me farei agora, agora!

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

O Julgamento de Capitu





Capitu e Bento foram concebidos nos mesmos sentidos em que se podem conceber as paixões. Suas construções ao longo da obra fazem florescer aspectos da vida humana em seus desejos, amadurecimento e, sobretudo, na descoberta do amor.
Capitu dá sentido à trama pelos seus olhos de ressaca ou cigana dissimulada. Sua curiosidade e a sua tendência ao domínio a tornam apaixonante mais por emocionar os leitores a  partir de suas vontades e da força do seu caráter do que por qualquer coisa que possa, simplesmente, representar. Bentinho é doce e apaixonado de uma forma ingênua e, ao mesmo tempo voraz. Ele é quem perde o controle enquanto Capitu planeja e carrega o ônus da espera. Sim, esperar quando se fica é mais difícil.
Entretanto, Capitu e Bentinho não existem ou existiram. O sentimento que nos é proporcionado se deve ao gênio do autor que usa seus personagens para descrever aquilo que deseja. O destino da ficção é falar coisas reais por caminhos criativos. Explico: a ficção representa. Enquanto os outros gêneros descrevem e tentam provar. A literatura ficcional, acompanhada da poesia experimenta as possibilidades sem compromisso de assumir uma verdade. Por isso, Bentinho não é teu vizinho a quem você espera algo e imagina que seus atos sejam motivados por algo externo. Suas motivações são internas e só se comunicam com o que vem da trama. De Capitu, nada interessa senão o que está escrito. Tudo o que se projeta, além disso, são desejos de quem lê. E quem lê, não tem o direito de interferir na obra do autor.
Se me preguntam se houve a traição: a resposta é sim e não. Não que exista a dúvida, pois a situação exposta é clara. Ela traiu e não traiu, estando tudo bem exposto ao passo que é exatamente isso que dá significado à obra.
Pensar em uma possibilidade implica em tirar a dúvida de Bentinho. Logo, não haveria mais a confusão que o caracteriza na obra e nos leva à angústia dos personagens.
Se Capitu traiu, ela é culpada pela confusão de Bentinho. Se não, Bentinho estaria incorrendo em injustiças; e o livro não fala em culpados e injustos. O livro fala em possibilidades inerentes ao ato de amar dando destaque ao ciúme.
Todos os personagens da obra são magníficos e a sutileza da composição da dúvida é o ponto máximo deste exemplo da genialidade humana que é Dom Casmurro. Nossos vícios em procurar soluções, culpados, causas e consequências podem nos cegar ao ponto de não nos permitir extrair da obra o que ela tem de mais genuíno e interessante: a expressão do homem em seu melhor ângulo que é o externo. Ou seja, o ângulo do escritor que capta do homem aquilo que o homem tem para oferecer, mas só é capaz de descrever quem o vê de fora. Neste caso, o autor. Avida é vazia de sentido por precisar de propósitos que a signifiquem, enquanto a literatura é livre para expressar-se em sua própria dinâmica de sentidos. A arte não é refém da vida, ao passo que consegue ser externa a ela.

sábado, 23 de julho de 2011

Amor em três atos-palavra



I

Pela alma que cravejas no papel


Pelo sorriso que vejo em análogas formas


Tua arte indica a mim teu corpo e teu espírito


Ao teu corpo, corro com a destreza de tua palavra


Ao espírito viajo nas entrelinhas que me ofertas


Vivo cada sílaba, estribilho


Ou o que o valha


Sou amante do teu eu


Bebo cada inspiração que jorra em teus versos


Beijo seu rosto, página por página


Acaricio teu corpo a cada poema lido


Apago a luz


Celebro-te


Amo-te


ll





Querido leitor,


O quanto podes me ver em versos,


Sou a resposta de teus olhos


A sedução que escolheste a padecer


O fruto da vontade tua de amar


O sofrimento imposto e colhido por ti


Se escrevo versos que em meu nome me anunciam


Existo logo em teu peito no desejo que esmeras


Se em versos há de me amar,


Vê meus versos e sê tua paixão


Ama-me


Amando a ti.





Ill





verdade


Que escapa das mãos e faz versos


A verdade descoberta (possível)


O desejo humano


                           Sobrepondo o humano que deseja.

sexta-feira, 22 de julho de 2011

cidade concreto

Quando naveguei entre pessoas e cidades
Vi concretos dinâmicos como água
Vi prédios e monumentos
Tudo era mutante (mutável)

Vitrais de igrejas
Belos e nefastos

Em cemitérios
Túmulos ornamentados:
Fins e histórias

Ao opulente prédio
Poder de uns
Indiferença de outros
Trabalho
Lazer
Para quem dorme, Marquise
Abrigo como ponte ou laje

Ruas
Ruas
Para quê tantas ruas?
Ruas de ir, de vir
De morte
De chegar
Ou de somente andar

Quando naveguei entre pessoas e cidades
Tudo tinha várias formas
E a contemplar,
O homem de concreto
                                              
Duro
Estático
Perene

quinta-feira, 21 de julho de 2011

Todo verso

Acordei disperso


No espelho, reverso


De olhar inverso


Desejo perverso


Descobri:


A vida cabe no verso

quarta-feira, 20 de julho de 2011

olhos de ser






Em meus olhos não figuram formas

Se candura

Construo ternura, e beleza suponho crer

Se medo

Não vejo a forma do risco que me cerca

Construo o forte no porte que me cabe

Em meus olhos não figuram formas

Vazio, é o mundo que me mostra a face

Todas as cores são minhas

Meu, é o universo infinito dos prazeres

Se dói, é a dor de meu não querer

Em meus olhos não figuram formas

Não vejo o rosto sombrio

Não rio com a criança feliz

Não choro quando parte o amigo

Em meus olhos não figuram formas

e quando julgo e penso que vejo

quando o outro parece se fazer presente

é quando não sei mais do espelho que carrego à mente

sábado, 16 de julho de 2011

O poema que não foi

Cá estou eu a ler “profissão de fé”
Poema mal tratado e vilipendiado
Que por obra e graça de meus mestres em letras
Só lembrava parco pedaço
De tudo que nele tenho
Só lembro, de ser quadrado

Parei para ler.
Belo poema, o profissão de fé.
Andei pelos anseios pela pena e pelo cinzel
Tão bom que quis fazer igual.
Igualmente não capitolino
Queria a forma do ourives e, a ela, me lancei
Colhi palavras, pensei as rimas
Pensei
 imaginei e calculei
Mas a palavra me desobedecia
Fugia, corria e ficava onde queria
Preciso terminar em “ar”, eu dizia
Mas a palavra teimava
Queria rimar “amar” com viver intensamente
Queria rimar “sentir” com deixar-se conquistar
“Outro”, queria que rimasse com parte de nós
Lutei, relutei
Mas deixei meu poema viver.
Afinal,
Poema que imita ourives ganha forma
Poema que imita poema ganha 100 anos de perdão

sexta-feira, 15 de julho de 2011

Identidade

Minha identidade não reconhece etnias
Não fala idiomas
Dos povos, só quer a vontade que o povo tem

Minha identidade não lê regras
Não se vê em grupos
Dos encontros, quer a magia da entrega e da união.

Minha identidade não sabe o que é estética
Não se afirma na arte
Dos sons e das cores, quer o desejo de ir além.


Minha identidade não está no proletário
Não sabe da política
Das lutas, busca o brilho do suor e a vitória da liberdade

Minha identidade não reconhece os países
Não sabe das fronteiras
Minha identidade
Sonha
E no sonho vive
O caminho da liberdade

ARQUITETURA DA DESTRUIÇÃO (resenha)

ARQUITETURA DA DESTRUIÇÃO:

Gênero: documentário;
Direção: Peter Cohen;
Idioma: alemão;
Produção: 1989 / 1982

Após uma breve introdução sobre a forma em que uma pequena comunidade de aldeãos se relacionava com o ideal nazista, a tomada aérea da pequena aldeia repleta de vegetação sugere de lugar isolado, por onde o ideal de pureza e suas significações começam a ser desvendados em sua origem e relação com a vida íntima de seus defensores.
O filme “corta” para o registro da celebração do “dia da cultura”. O plano é o de um expectador e as imagens ficam mais agitadas, remetendo ao dinamismo urbano onde as ideias fazem parte de uma dinâmica política e os atores sociais se mostram efervescentes na vivência da nova realidade social alemã; em detrimento, do isolamento bucólico da primeira imagem.
O registro do desfile é épico e reflete o ponto de vista de seu objetivo: a exaltação dos símbolos nazistas e da enaltecida liturgia nazista. Militares, cavalos, estandartes, personalidades públicas em tomadas alternadas com a plateia que aplaude e apoia a parada.
Ainda no desfile, temos registros que apresentam parte da problematização que irá se desenvolver ao longo do filme. A narração é acompanhada por imagens de estátuas representantes de um ideal estético, e tomadas de um ângulo inferior, o que aumenta a perspectiva em relação a seu tamanho e imponência. Vale o registro, que estas são imagens captadas com o misto propósito de informação e propaganda, sendo usadas no filme com o reconhecimento da relevância dos propósitos cinematográficos como relevantes para a compreensão não só dos fatos, mas das possibilidades de “narração” contemporâneas a eles. Desta forma, as fotografias e os vídeos oficiais explorados pelo filme remontam a própria vontade de Hitler em conferir à liturgia de seus eventos o ideal de perfeição estética.
O filme trata a ambição estética nazista em associação às projeções artísticas de Hitler e seus correligionários em uma superação da simples vivência artística enquanto elemento cultural dissociado das outras esferas da vida pública. A apropriação estética da arte é algo intrínseco ao próprio sentido da vida, sendo referenciado às ações humanas as concepções artísticas e a filosofia pela arte empregada. A própria arquitetura na pretendida nova Alemanha acompanharia a imponência no novo povo que surgiria. Um exemplo desta simbiose político-estética estaria contido na frase repleta de significados que proferiu Hitler: “só entende o nazismo, quem conhece Wagner”. O compositor é exemplificado também no filme em sua importância na composição do ideário nazista.
Em um tom documental, é retratada a posição dos artistas e teóricos partidários do nazismo quanto à mistura dos valores estéticos com a concepção de raça e saúde mental e física. Se a arte conceituava o mundo, Hitler tinha na antiguidade sua inspiração e obsessão. O ideal estético que ajudou a justificar a eugenia tem lá suas raízes e o ideal da representação de homem. A oposição à perfeição estética clássica era a arte moderna, a qual, chamavam de arte degenerada associada aos bolcheviques e aos judeus.
Quando a limpeza era associada ao ideal nazista, o povo alemão era conclamado a assimilar sua higiene pessoal ao esforço do “corpo” alemão pela purificação da raça. Pelo “bem estar estético” e pela higiene pessoal, “arquitetura da destruição” mostra, que os operários poderiam se distinguir da ideia de uma classe que os unisse. A “melhoria” nos hábitos e na higiene os elevaria à semelhança aos burgueses. Assim, teria fim qualquer conflito de classes na Alemanha.
A narração não expõe as imagens nem as descreve de forma exata. A associação entre as imagens, as músicas e a narração é feita independente, de modo que, como linguagens distintas que são passam de forma distinta as imagens que se comunicam no propósito documental do filme e na problematização das questões históricas colocadas e no desenvolvimento da auto conceituação nazista amparado em valores relativos à arte  e a forma como isso desencadeou no genocídio nazista e em sua justificativa moral.
A imagem ganha, assim, um valor não só documental / ilustrativo, como é capaz de “narrar” fatos e valores quando esmiuçadas no sentido de investigar quem as produziu ou quem as reproduziu. As intenções, as pressões sociais, as negações (no caso da negação nazista à arte moderna), a busca formal da arte e a consagração destes valores formais apontam caminhos mais que válidos para a compreensão das dinâmicas históricas do mundo em que vivemos e ajuda, acima de tudo, a reconstruir a história do mundo que não passa somente pelos grandes eventos em sua magnitude e registro. A relação do homem com a imagem nos fornece dados para entendermos quem era este homem que se relacionava com os muitos valores que as imagens podem retratar. Acima de tudo, é preciso entender o homem que participa do evento histórico para entender seus valores e anseios no sentido de reconstruir os alicerces da história e perceber que espécie de alicerces estamos a edificar.

quinta-feira, 14 de julho de 2011

Imagem poética ou poética da imagem

A arte tem o hábito e a vocação de reduzir os objetos do cotidiano para expandir os horizontes da percepção. A redução é a linguagem sutil que aumenta o tempo de vivência do ato e reconstrói as possibilidades da percepção do momento.
Na poesia, as palavras formam uma elipse onde a linguagem poética reduz a palavra pela forma e na forma mostra as novas possibilidades daquilo que deixa de ser algo corriqueiro, passando a tomar novas faces que continuam a ser exploradas pelas novas palavras.
O momento eleva a percepção e constrói um significado novo que expande o contexto do antigo, aplicando a nova ideia. Porém, a arte não transforma a percepção da vida, mas distrai o todo que atrapalha que vejamos a riqueza das coisas. A redução se torna, assim, a possibilidade do detalhe onde tudo é constituído, e pela constituição, a lógica de tudo.
Um objeto reduzido em seu detalhe é a fuga da forma bruta do todo, que paradoxalmente precisa ser esfacelado para ser entendido. O todo vira contexto e o detalhe, a vida que existe no objeto. A poesia resgata pelas palavras o detalhe amplia os horizontes da percepção e da contemplação. Reduz o plano e aumenta o tempo.
A fotografia, por sua vez, contrasta o universo com o foco do fotógrafo. Suas escolhas paralisam a imagem e fazem do detalhe a alma e a visão mais que possível de tudo o que é. As formas escolhidas pelo fotógrafo captam mais que os olhos, pois os olhos não sabem reduzir. Como não sabem reduzir, as palavras que não se propõe a serem poemas. A fotografia é o olhar além do olho, a percepção do homem que explica o todo pela parte e imortaliza o momento em que algo pôde ser visto, não podendo se deixar passar.
O olhar fotográfico aumenta as possibilidades de visão, pois sabe reduzir o mundo ao seu detalhe.

domingo, 10 de julho de 2011

O quadro

- O que pintas?
- Um quadro para a posteridade.
- O que é?
- Não sei. Acho que estou pintando algo que quero muito.
-Como podes não saber o que pintas se tão seguros e precisos são teus traços? Se chegares então a alguma forma, e se isso for o que desejas? Teu desejo será então póstumo à tua vontade de querer isso. Tirando, assim, o sentido de tua vontade.
-Então, deixo aqui estes traços que ainda são abstratos, e chamo meu quadro de vontade, pois será póstumo como convém, agora, que seja; sendo presente por ser o querer que tenho, torna-se, assim, a vontade de querer. Depois, penso no querer que quero.

sexta-feira, 8 de julho de 2011

Socorro!

Acudam! Acudam!
Dizia o grito de socorro.
Acudir de quê?
Da fome alheia, da violência e dos assaltos
Não vais me ajudar?


Acudam! Acudam!
Dizia o grito de socorro.
Acudir de quê?
Das favelas, das multas e do caos aéreo.
Não vais me ajudar?

 
Acudam! Acudam!
Dizia o grito de socorro.
Acudir de quê?
Dos mendigos, do IPTU e das crianças de rua
Não vais me ajudar?


Acudam! Acudam!
Dizia o grito desocorro.
Acudir de quê?
Do trânsito, do camelô e do mau gosto da periferia
Não vais me ajudar? 


Acudam! Acudam!
Dizia o grito de socorro.
Acudir de quê?
Das bichas, dos maconheiros e das más famílias
Não vais me ajudar? 


Acudam! Acudam!
Dizia eu:
Acudam o grito de socorro!

A verdade poética de Catarina

Com o mundo aos olhos, Catarina andava,
andava e procurava sempre andar mais.
Catarina era a criança viva de passagem por parques, ruas e escolas.
Catarina tinha olhos de ver o mundo de criança.
Catarina vivia o que via, e sentia que vivia
Catarina aprendera a verdade poética
Catarina via o silêncio entre as palavras
Catarina sabia dos, olhos os olhos que viam Catarina 
Catarina conhecia a verdade poética
A verdade dos gestos tímidos a grandeza do olhar perdido
Catarina não sabia,
Mas via do mundo
mais que a estética que o mundo dá
Catarina não sabia da beleza das coisas
Catarina sabia da beleza, a destreza que se deve dar
Sabia que de tudo o que via, via mais
Catarina andava e andava
Andava entre as flores,
Mas ,das flores, nada queria
A verdade poética de Catarina
Era a mão que plantava
A vontade do olhar e o presente da amante
Catarina
andava por homens e carros
Na visão da menina, famílias, lutas e amores
Catarina
não tinha a cidade parada dos prédios
Catarina queria o suor do trabalho, o lar e as marcas
(Quando marcas, deixadas eram)
Do operário, as lutas das massas
O uniforme e a alegria da chegada em casa.
Catarina
não via homens nem mulheres,

Catarina
tinha nas costas o caminho
caminho de quem andava a ver
Catarina cresceu
Descobriu a palavra
A palavra poiese
A palavra, de sua verdade.

quarta-feira, 29 de junho de 2011

Concreto formal e vísceras

De parto a parto
Aparto
 Palavra
Palavra da ideia
Palavra palavra
Parto da palavra
Parto da palavra
Faço palavra
Palavra concreta
Dura
Dura palavra quebrada
Que dura
Dura o tempo do parto
Parto da palavra pesada
Parto para o mundo da palavra quebrada
Parto para a coisa da palavra coisa
A palavra é coisa
Parto
De palavra pesada
Que mexe
Palavra viva que é palavra
Concreta
formal
Vi a palavra pesada
Crescente
viva
Quebrada
Que
Vi rá
Vi
s ce rá
Vi ral
Visceral 

segunda-feira, 20 de junho de 2011

Mudanças

Mudanças não são boas nem ruins, simplesmente, por que nada é bom ou ruim atoa.

Não esperem que uma mudança em sua vida seja benéfica por si mesma. Como se, por um passe de mágica, só o que precisamos é mudar para sermos felizes.

Mudanças são opções, escolhas e, sobretudo, caminhos. Mudar por si só, não muda nada. Não traz sorrisos, força, ou qualquer coisa que valha. Mudar só traz a mudança. Isso mesmo! Mudar significa não fazer mais as mesmas coisas, não ser a mesma coisa ou não estar no mesmo lugar.

Podemos mudar de amigos, mudar de casa, de família ou de emprego. Mas se a mudança não for um caminho a ser trilhado, não mudamos em nada. Não saímos do lugar e, pior, disfarçamos aquilo que tanto nos fez querer mudar.

Mudar exige mais que a vontade de deixar algo para trás. Exige a coragem de olhar para trás e encarar tudo outra vez. Exige reconhecer os erros e os acertos e, depois, mudar tudo o que pensamos sobre erros e acertos. Exige saber que erraremos tudo de novo e acertaremos tudo de novo. Mudar é olhar as pessoas de frente e saber o que elas significam, é se olhar pelos olhos das pessoas e saber o que você significa. Mudanças exigem a sabedoria de perceber o mundo a sua volta não pelos mesmos paradigmas, mas pondo novos olhares em tudo.
Para mudar de verdade, não devemos mudar as sombras e as feridas do que ficou para trás. Uma mudança não deve ser só um recomeço. A mudança exige respeito aos caminhos trilhados até então, pois se não, se tornam fugas vazias.
 O melhor da mudança é poder escolher o novo caminho baseado no velho. As vantagens de quem muda não são as mesmas de quem começa, pois quem muda traz consigo marcas de escolhas vividas. É como se pudéssemos navegar oceanos já tendo conhecido as estrelas que nos guiam.
 Para mudar, precisamos, acima de tudo, nos respeitar. Nos respeitar sem as certezas que tínhamos antes. Precisamos nos conhecer e saber que precisamos nos olhar de forma diferente. Mudar pode curar feridas, mas nunca deve apagar as cicatrizes.

Nossa memória é nosso mais valoroso bem. Pode não ser o mais confortável, nem o mais esplêndido; mas é o que temos de mais nosso. É o que somos.

Mudar não é ser outra pessoa. Não é deixar de ser o que somos. Mudar não é morrer! Nem tente! Não vamos renascer. E o melhor de tudo, é que ninguém precisa nascer de novo para ser feliz.

Mudar não é violento. Não requer radicalismos. Mudar é simples: é querer mais, querer diferente; é um "não querer mais" e um "não querer diferente".

Mudar é se por à prova. Provar para si que pode e quer viver mais e além. QUERER provar para si que se pode querer viver mais e além.

Mudar não é uma decisão de vida, pois em uma vida não existe uma decisão. Mudar é rever os caminhos. É pensar nos caminhos.

Acima de tudo, mudar não cura, não faz feliz, nem realiza sonhos. Quem faz isso é quem muda. 

sexta-feira, 17 de junho de 2011

ledo íntimo

Ledo íntimo

 Alegre em si e nada mais

Ledo engano

domingo, 12 de junho de 2011

As casas.

Os azulejos nas casas coloniais são como os poemas
A fria palavra talhada e ornada
Tal qual a palavra que não sabe a que nasce
Mas nasce e renasce na mão do poeta
Os azulejos das casas coloniais
Contam e emprenham de vida a vida que emolduram
Correm-se os olhos nas cores e nos desenhos
Nas janelas,
 as flores, as belas
As velhas a fofocar
 São temas da poesia
Que objetos se tornam
Ornadas pela pedra, pela tinta e pela mão do artista a revelá-las.



Afora isso, nenhuma imagem, depois, faz sentido

sábado, 11 de junho de 2011

O Sonho

Esta noite sonhei que era um cara que consertava coisas. Tinha um talento especial para consertar e refazer as imagens que coisas novas proporcionavam às pessoas.
Em meu sonho. Eu tinha que consertar uma pulseira que era muito importante para alguém.
A dona da pulseira me ligava a toda hora, querendo saber se eu já havia acabado o serviço.
Muito ocupado, eu não consegui acabar.
Acordei.
Tive uma sensação estranha ao acordar. Pensei naquilo que não terminei enquanto sonhava. Lembrei que usava roupas estranhas e falava em alegria. Lembrei que consertava coisas enquanto sonhava.
Enquanto a vida voltava ao normal, em tudo que eu tinha para fazer, pensei se existia um lugar para onde iam as coisas que eu tinha que fazer enquanto sonhava. Perguntei se existia alguém que ainda esperasse o que eu havia começado

domingo, 15 de maio de 2011

Quem tem medo dos humoristas?

 
A, não tão nova, onda de patrulha e discussão sobre o direito de os humoristas tratarem ou não de determinado assunto teve sua recente tensão aumentada pelo destaque dado à mídia ao deputado Bolsonaro, que em suas incursões midiáticas, nos proporciona sua  verborragia preconceituosa e nada espontânea (cabe aqui, uma pequena pausa para um minuto de reflexão acerva do caráter eleitoral de suas falas e a forma como trabalha o imaginário do povo conservador que o tem como representante).
Piadas sobre judeus, gays, ou quem quer que seja passam por uma censura moral mais difícil de combater do que qualquer DOI CODI físico que todo mundo pode saber  onde está (ao menos no sentido aqui exposto, esclareço para não pensarem que não sou sensível aos problemas, por este, causado). Esta censura, condena com ofensas pessoais (!?) e desmerecimento(!?) profissional qualquer tipo de manifestação que aborde os temas tabus em questão; como se fazer aquela piada sobre o veado que descia do ônibus e... Fosse o mesmo que tratar diferenciadamente dois jovens de orientações sexuais distintas em uma entrevista de emprego pelo seu trejeito, ou pela sua forma de falar (citar somente a opção seria rasteiro e pobre).
Sobre os judeus, o tema se torna mais complexo ainda. Não que uma forma de preconceito seja pior que a outra, mas o tabu em relação ao judeu é mais institucionalizado. Tocar em um aspecto referente ao estereotipo construído acaba sendo confundido com levantar a bandeira de uma política que se constitua, entre outras coisas, através do genocídio. A questão fica tão grave, que não se percebe o quanto é hipócrita esta defesa, pois vivemos e levantamos a bandeira de um sistema de VIDA, que sob o argumento de um discurso democrático faz guerras de caráter escuso, destrói a dignidade de povos usando representações desastrosas de suas culturas como meio de justificar a centena de bombas que receberão em suas cabeças.
Enquanto países excluídos do ciclo de “progresso” capitalista estão passando fome, um povo tem sua reputação vilipendiada e um país desrespeita totalmente o outro para caçar o SEU inimigo sob nossos aplausos, o cretino da história se torna o cara que vive de acentuar estereótipos.
Não sou nem um pouco entendido de teorias do humor, ou qualquer coisa que direcione a formação destes profissionais, mas imagino que uma forma de composição seria provocar o riso buscando possibilidades inusitadas de desfecho de uma determinada situação, ou um paralelo entre situações que de tão inusitadas venham a provocar o riso.
Eles trabalham com a representação. A representação está lá! É o objeto de trabalho de quem REPRESENTA a vida de modo a “congelar” pequenos recortes do cotidiano dando-lhes outra significação. Isso ocorre na fotografia, na literatura ou no humor. Cercear as possibilidades criativas é cercear o trabalho de alguém. Caso este alguém entre em desalinho com a expectativa do público, ele cairá no esquecimento. Se isso não acontecer seria muito mais interessante tentar entender o motivo da aceitação do que ser agressivo com o humorista.
Sei que retrucarão que a piada pode ser combustível para o preconceito. Mas vamos pensar em outra perspectiva: vejamos a piada como manifestação da memória, e tenhamos em mente a importância desta memória para a compreensão de nossa formação histórica.
Vejo que a ira causada por certas manifestações se dão mais por não permitir que um outro fale de ti (pessoas de fora iradas, seria, por concordarem com as primeiras), do que por uma questão de lembrança causada ou pela dor que certas composições de cenas descritas podem causar. Francamente, não acredito que aquele que tem em seu povo a marca de anos de luta pela sobrevivência vá se magoar por ser pechado de pão duro ou por dizerem que um determinado vagão o remeteria mentalmente a Aschwitz. Nem tão pouco, concebo a possibilidade de alguém que teme perder o apoio da família e teme manifestar carinho em público vá se ofender por ser chamado de bichinha.
Infelizmente, não existe uma medida certa para orientar o humor, e quem tenta fazê-lo recorrendo a um subjetivo bom senso não percebe que suas delimitações não brotam feito relva nem surgem ao acaso dos ventos. Particularmente, não gosto dos valores burgueses enaltecidos nas telenovelas, mas sei que isso vem de uma vivência individual. O que não me faz sentir a vontade para travar uma “cruzada pela moral operária contra as telenovelas” como estão fazendo com os humoristas.
 Lembremos, que somos todos diferentes e em cada diferença reside uma possibilidade de estereótipo que pode ser cômico ou triste e citar este estereótipo é tratar esta diferença.
Quero respeitar e conhecer a história do povo judeu, bem como quero respeitar e continuar amando meus amigos gays, mas sem imposições morais ou cerceamento de minha liberdade de expressão.  

sexta-feira, 22 de abril de 2011

Sobre a música João do Amor Divino - Gonzaguinha














Esta música está naquele que, para mim, é o melhor  disco deste poeta genial que, como poucos, soube representar nosso povo em sua relação com a história.

Gonzaguinha, em sua arte, não descrevia a história ou contava fatos em versos. Tal qual um simbolista ele captava a essência daquilo que ia representar e criava as imagens que descreveriam aquilo que pensava sobre determinada situação. Seu realismo não se torna anacrônico nem,tão pouco, um retrato de época porque ele falava dos sentidos e sentimentos possíveis do homem frente ao seu momento histórico. E isso não tem começo nem fim é humano e pronto.

Nesta música, em especial, o elemento poético e seu propósito estão na forma em que, ao mesmo tempo, em que seu personagem é apresentado, vai criando as imagens e apresentando em simples versos questões que renderiam horas de debate. Neste caso, esta ideia fica flagrante quando a
chepa da feira não chega a estarrecer, as filas e a relação com a comodidade proposta pela ideia da proteção (ou recompensa) divina.
Seu “bilhete mal escrito”, também não é uma simples oração a ser musicada. Bem como, o verso “ele se mexeu” que aparece isolado tanto na letra impressa como na música a fim de dar o toque mágico do enredo.
Enredo este, que guarda para o final uma maravilhosa surpresa quase fantasiosa onde o homem se levanta depois de ter sua tragédia pessoal servido de entretenimento para os indiferentes transeuntes
(isso também geraria horas de discussões).
O fato de ele se levantar em oposição à opção natural que seria sua morte é o elemento poético que dá sentido à proposta do artista de representar o ciclo trágico de miséria e sobrevivência do trabalhador brasileiro que é obrigado a se valer de toda a sorte de “malabarismos sociais” chegando ao extremo máximo que neste caso é tirar vantagem do desesperado suicídio para garantir sua sobrevivência (esta é uma contradição que valeria toda atenção deste espaço).
A música não conta com as belas melodias que marcaram a obra de Gonzaguinha. Entretanto, vale ressaltar que as melodias de suas músicas acompanham, em sua maioria, o sentimento pertinente ao que apresenta a letra e o enredo que por sua vez alterna momentos mais tensos e mais suaves ao sabor da ideia apresentada.
Esta não é uma das músicas mais consagradas do artista, mas é uma das mais emblemáticas para a compreensão da proposta estética e Gonzaguinha e a relações sociais tão marcantes neste conturbado período político e social de nosso país.
Para ouvir esta e outras músicas clique aqui




João do Amor Divino

Gonzaguinha

Composição : Luiz Gonzaga Jr.

39 anos de batalha, sem descanso, na vida
19 anos, trapos juntos, com a mesma rapariga
9 bocas de criança para encher de comida
Mais de mil pingentes na família para dar guarida
Muita noite sem dormir na fila do INPS
Muita xepa sobre a mesa, coisa que já não estarrece
Todo dia um palhaço dizendo que Deus dos pobres nunca esquece
E um bilhete mal escrito
Que causou um certo interesse
É que meu nome é
João do Amor Divino de Santana e Jesus
Já carreguei, num guento mais,
O peso dessa minha cruz
Sentado lá no alto do edifício
Ele lembrou do seu menor
Chorou e, mesmo assim, achou que
O suicídio ainda era o melhor
E o povo lá embaixo olhando o seu relógio
Exigia e cobrava a sua decisão
Saltou sem se benzer por entre aplausos e emoção
Desceu os 7 andares num silêncio de quem já morreu
Bateu no calçadão e de repente
Ele se mexeu
Sorriu e o aplauso em volta muito mais cresceu
João se levantou e recolheu a grana que a platéia deu
Agora ri da multidão executiva quando grita:
"Pula e morre, seu otário"
Pois como tantos outros brasileiros
É profissional de suicídio
E defende muito bem o seu salário
Do álbum: Gonzaguinha da Vida (1979) - EMI/ Odeon.

terça-feira, 19 de abril de 2011

Discursos sobre cotas raciais em sala de aula.


Este foi um relatório sobre uma atividade realizada em 2009

Discursos sobre cotas raciais em sala de aula.





A exemplo de uma aula ministrada no pré-vestibular comunitário de Manguinhos (PVCM)






e


            Desde julho de 2004, quando depois de 5 anos de discussões, 20% das vagas de todos os cursos da UNB são reservadas para alunos da cor negra, é comum em debates sobre educação, o questionamento acerca dos valores éticos que envolveram a elaboração e aplicação das cotas raciais no Brasil.
            Meu objetivo neste texto não é exatamente entrar no mérito da justiça ou da legitimidade das cotas raciais. O que proponho é uma investigação sobre os elementos que norteiam as discussões e o que se pode aproveitar disso para a compreensão da percepção política dos estudantes.
            Em uma turma de pré-vestibular comunitário situada em Manguinhos, na cidade do Rio de Janeiro, foi proposto um debate entre os alunos, de maioria negra ou descendente de imigrantes nordestinos, ou os dois. 100% da turma era composta por moradores da região que ainda cursavam o último ano do ensino médio, que o concluíram no ano anterior e por alunos que retornavam após um longo período afastado de atividades acadêmicas.
            O debate se iniciou de forma abrangente, com uma pergunta simples: “qual a opinião de vocês sobre as cotas raciais?"
            O primeiro aluno a se manifestar foi um jovem negro que trabalhava em um escritório de contabilidade e que não enxergaria outra forma de ingresso em uma universidade pública senão pela iniciativa da comunidade em manter um pré-vestibular comunitário sic.
            O aluno relatou não ser candidato a uma vaga de cotista, por não admitir a possibilidade de ser submetido a um julgamento mais brando de suas competências e por não se sentir a vontade com a possibilidade de ser estigmatizado como um candidato “beneficiado pela sua cor”.
            Alguns alunos taxaram a medida de racista, por julgarem beneficiar um determinado grupo social. Estes alunos se dividiram em dois: de um lado os que consideravam que a medida traz consigo a ideia de que os brancos seriam intelectualmente mais capazes que os negros, e que por esta concepção, o projeto haveria de ser rechaçado; e os que consideravam que o “benefício” dado aos negros seria uma espécie de favorecimento, fruto de uma retificação que tomou caminhos equivocados. Nesta última ideia, a falta de uma justificativa histórica mais coerente faz com que não se conceba a ideia de uma dívida, ou uma reparação histórica que justifique um “benefício” de tal natureza.
            Um outro grupo levantou a possibilidade da ineficácia do projeto em equilibrar a atual situação de desequilíbrio da composição social das universidades públicas. Neste caso, a medida proposta mais coerente seria a concepção de projetos que fortaleçam a escola pública, para que os alunos dela oriundos, tenham condições iguais de se candidatar à uma vaga nas universidades.
            Por fim, houve quem levantasse o suposto risco de redução do nível das universidades públicas, ao passo em que candidatos com menores pontuações fossem aprovados. Normalmente, esta ideia é atrelada a uma supervalorização do vestibular enquanto ferramenta de medição de conhecimento.
            Algumas coisas devem ser levadas em consideração ao abordarmos este assunto. Primeiro: o “mérito acadêmico” não pode considerado, levando em consideração um sistema de avaliação que apesar de algumas diferenças entre as instituições, privilegia majoritariamente a capacidade de acúmulo de informações, habilidades que exijam horas de treinos que não condizem com a realidade da maioria dos jovens brasileiros que começam a trabalhar antes dos dezoito anos. O vestibular está longe de ser uma prova equânime que classifica os alunos segundo sua inteligência. Está claro que realidades sociais distintas haverão de gerar resultados distintos.
            Vale lembrar que historicamente a educação serviu de parâmetro para a identificação social de indivíduos. Desde as antigas instituições para jovens, famílias abonadas iniciaram seus filhos em ciências de caráter altamente exclusivistas, como as lições de latim e grego entre outras. O jovem mais capacitado para o trato social seria sempre o jovem com mais possibilidades de comprovar o conteúdo adquirido. O vestibular, muitas vezes não faz outra coisa senão apresentar uma enorme dose de continuísmo em relação a estas concepções de mérito.
            Outro ponto importante para se considerar, é o caráter lucrativo deste sistema de acesso, pois com a cada vez maior importância dada culturalmente ao vestibular, as escolas se voltam para uma modalidade de ensino que privilegia o certame em detrimento das demais funções da educação. Com o propósito da educação de tal forma distorcido, ficam dadas todas as condições para que as “indústrias” do vestibular se proliferem, com suas filosofias individualistas e seu caráter competitivo, se instituindo cada vez mais como as verdadeiras detentoras do caminho da excelência em educação.
            Voltando ao ponto de nossa questão, o debate realizado com os alunos, tomou um outro rumo quando foi feito um questionamento: “...e se as cotas não tivessem sido dadas, e sim conquistadas? Em que pé estariam estes argumentos”.
            Neste momento, com os alunos pegos de surpresa, foi realizada uma breve exposição sobre leis de iniciativa do estado e conquistas de movimentos populares. O que muitas vezes não é considerado nas abordagens da mídia ou nas reflexões sobre as mudanças dos cenários políticos sociais ou educacionais.
            Os alunos foram instigados a rever seus conceitos sobre como encaravam as transformações sociais e seu papel frente a necessidades iminentes de mudanças nas estruturas sociais, posto que não mais só se coloca em questão, o impacto de uma mudança deste caráter na vida de um ou dois indivíduos contemplados, mas se vislumbra uma possibilidade de democratização.
            É vital para que se compreenda as questões de políticas de cotas perceber que este movimento não partiu das universidades enquanto representante dos interesses estratégicos do Estado, nem tão pouco de iniciativa de grupos legislativos majoritários. Ao se pensar desta forma, fica cada vez mais difícil se considerar que houve uma tentativa equivocada de se equacionar problemas educacionais por parte do governo, ou considerar uma manobra de cunho político eleitoral, ou de simples benefícios dados aleatoriamente.
            Muitas vezes o que falta nestas discussões é a compreensão dos conflitos de interesses e das conquistas e derrotas dos movimentos sociais na dinâmica das transformações sociais.
            Ao menos, neste ponto, esperamos ter atingido um passo importante para os futuros questionamentos dos alunos.